sexta-feira, 2 de abril de 2010

A prateleira ao lado é mais saudável.

Seção: Bazar.
Quem viveu na década de 1980 se lembra muito bem do nome Patrícia Marx. Seus sucessos Festa do Amor e Certo ou Errado não podem faltar nas baladas estilo túnel do tempo, tão em voga nos dias de hoje.
Muitos saudosistas lamentam o afastamento de Patrícia da mídia. Muitos, inclusive, acreditam que ela nem mais canta. Ledo engano.
Patrícia Marx ainda canta. Ou melhor: Patrícia Marx canta como nunca. Corrijo-me pela terceira vez: Patrícia Marx canta para ouvidos requintados.
A garotinha que, um dia, fora vocalista do grupo Trem da Alegria é, atualmente, dona de uma voz límpida e intérprete de canções belíssimas, as quais, infelizmente, não são tocadas em rádio, não têm refrão óbvio, não têm apelo sexual e não combinam com programas de domingo à tarde.
Patrícia Marx não sumiu. O que sumiu foi o requinte musical do brasileiro. Basta de bundas, de frutas, de sapos caindo na lagoa, de quadrados, de cinco velocidades... de rebolation! Tudo isso é comercial, é perecível, é efêmero... é empobrecedor.
Para refrescar a memória, ouça, abaixo, um grande sucesso dos anos 1980 de Patrícia Marx e, em seguida, sua mais nova pérola musical (Minha paz, canção lançada em 2009).






Outra voz nacional que amadurece dia após dia é Paula Toller (vocalista do Kid Abelha), que agora se dedica à carreira solo. Mas veja que curioso: foi só Paula Toller deixar de lado baladinhas superficiais como Fixação e se aventurar numa musicalidade madura que ninguém mais ouve falar em Paula Toller. É incrível o mau gosto do brasileiro! Enfim...
Agora, delicie-se com uma deslumbrante performance de Paula Toller, extraída do DVD Nosso, lançado em 2008.



Fernando Sachetti

O Lago dos Cisnes (duas variações)

Seção: Tricomas em pé.
O Ballet não é substantivo; é uma dança adjetiva. Ballet nem é dança; é a escuma do eterno por vir (assim mesmo separado: por vir). O Ballet é sutil, harmonioso, plástico, simétrico... é clássico. É indefinível porque adjetivo.
Fernando Sachetti




CORRIMÃOS ou CORRIMÕES?

Seção: Merenda.
O plural parece ser ponto pacífico entre os curiosos da língua. Afinal, que dificuldade pode haver ao se pluralizar cadeira ou embrulho? Neste caso, basta que se adicione a desinência –s para que os vocábulos anteriores abandonem a forma singular.
Tudo seria muito simples e, de fato, ponto pacífico não fosse a presença de um cidadão. Em itálico. De fato, os substantivos terminados em –ão oferecem grandes dúvidas quanto à formação do plural, uma vez que este pode se dar mediante o uso dos sufixos –ãos, -ões, -ães. Num rápido teste, tente o leitor descobrir o plural das palavras seguintes:

cidadão / corrimão / anão / cristão / vilão

Como se pôde perceber, todas elas terminam em –ão e, portanto, é natural que surjam indecisões quanto ao plural. Confira na lista abaixo os plurais desses e de outros substantivos de mesma terminação. Atente para o fato de que alguns deles admitem mais de uma forma plural.
SINGULAR - PLURAL
artesão - artesãos
cidadão - cidadãos
cristão - cristãos
pagão - pagãos
gavião - gaviões
folião - foliões
escrivão - escrivães
tabelião - tabeliães
ancião - anciãos / anciões / anciães
vilão - vilãos / vilões / vilães
cirurgião - cirurgiões / cirurgiães
guardião - guardiões / guardiães
anão - anãos / anões
corrimão - corrimãos / corrimões
vulcão - vulcãos / vulcões
Fernando Sachetti

"Tu tens um medo" - Cecília Meireles

Seção: Libido luso-literária
Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.

Não ames como os homens amam.
Não ames com amor.
Ama sem amor.
Ama sem querer.
Ama sem sentir.
Ama como se fosses outro.
Como se fosses amar.
Sem esperar.
Tão separado do que ama, em ti,
Que não te inquiete
Se o amor leva à felicidade,
Se leva à morte,
Se leva a algum destino.
Se te leva.
E se vai, ele mesmo...
Não faças de ti
Um sonho a realizar.
Vai.
Sem caminho marcado.
Tu és o de todos os caminhos.
Sê apenas uma presença.
Invisível presença silenciosa.
Todas as coisas esperam a luz,
Sem dizerem que a esperam.
Sem saberem que existe.
Todas as coisas esperarão por ti,
Sem te falarem.
Sem lhes falares.
Sê o que renuncia.
Altamente:
Sem tristeza da tua renúncia!
Sem orgulho da tua renúncia!
Abre as tuas mãos sobre o infinito.
E não deixes ficar de ti
Nem esse último gesto!
O que tu viste amargo,
Doloroso,
Difícil,
O que tu viste inútil
Foi o que viram os teus olhos
Humanos,
Esquecidos...
Enganados...
No momento da tua renúncia
Estende sobre a vida
Os teus olhos
E tu verás o que vias:
Mas tu verás melhor...
... E tudo que era efêmero se desfez.
E ficaste só tu, que é eterno.
Cecília Meireles